… Parecia ser mais uma manhã soalheira, igual a tantas outras, joão, algo estremunhado, abriu os olhos e sorriu, como se os seus cincos anos abarcassem o mundo, todo o mundo e suspirou: mais um dia de vida.
Parecia mais vivaço, mas tal como nos dias e semanas e meses anteriores, esqueceu-se dos seus deveres/prioridades matinais, como a higiene e o vestir da roupa apropriada; correu à procura dos seus amigos, o Tó estava lá, dormindo, o Pedro, mais consciente, estava no banho dental e o Duarte? Reparou que a cama estava vazia, como se nunca lá estivesse estado, como se não morasse mais; olhou em redor e não o viu; perguntou à enfermeira São, pelo seu amigo mais matreiro, por aquele por quem tinha criado uma amizade de irmão gémeo.
A resposta, não era aquela que esperava, que tinha ido para casa, mas ao mesmo tempo sorriu, porque pensou que o Duarte já se tinha curado e tal como todos os outros meninos dessa ala esperavam por esse dia.
João não sabia nem imaginava que o seu irmão Duarte, estava ali ao lado, em outra ala do IPO, na dos doentes terminais.
No fundo, não compreendia porque é que o Duarte se tinha ido embora, sem se despedir, já que na véspera, as brincadeiras terminaram, como era habitual; e a mãe do Duarte que quando o abraçava, a ele João, com toda a ternura, também nada lhe tinha dito. Uma profunda tristeza trespassou-lhe o peito, o sorriso ficou mais toldado. A mãe do Duarte, também era a sua mãe, a sua mãe do coração, como ela lhe ia murmurando ao ouvido.
João nunca tinha notado que os sorrisos e as gargalhadas da mãe do Duarte, nos últimos dias, eram diferentes, eram mais sombrios; nunca reparou que ela chorava lágrimas secas que lhe abriam sulcos profundos no rosto; não sabia que ela já lamentava a perda do seu menino, de uma vida que ainda não tivera oportunidade de viver.
João não imaginava que o Duarte, apesar de toda a abnegação do pessoal médico, de enfermagem e auxiliar, estava condenado a morrer.
Os Pais do Duarte, o João e todas as outras pessoas (Crianças e respectivos pais) não sabiam que os tratamentos que dariam a vida ao Duarte, contrariavam as políticas de restrição orçamental do Governo: O Deficit Público e a Crise Internacional.
João não sabia, nem se lembrava de alguma vez ter conhecido a sua mãe ou o seu pai, como os outros meninos tinham. João, apenas conheceu o mundo, quando tomou consciência do lugar onde estava.
Não sabia que, por causa da sua doença, os seus pais biológicos, pessoas de classe média/alta, se recriminaram mutuamente, acusando o outro de ser o culpado, pelo que estava a acontecer a este filho. Palavra puxa palavra, da violência doméstica psicológica, passaram para a violência física e depois para o divórcio; no entanto, nenhum queria assumir o ónus da responsabilidade pela tutela de João. Conseguiram que fosse internado no IPO e fizeram notar que abdicavam do respectivo poder paternal.
Mais uma criança abandonada que entrava nas estatísticas.
Os Duartes nunca saberão que para viverem mais um dia talvez não haja mais um euro disponível.
Os Duartes nunca saberão que o Governo deu 1,8 milhões de euros ao BPN para salvar os amigos.
Os Duartes nunca saberão que a Segurança Social depositou, em capitais de risco, no BPN, cerca de 800 milhões de euros.
Os Duartes nunca saberão que o Governo, para salvar o BPP do amigo e camarada Rendeiro, avalizou cerca de 2 mil milhões de euros.
Os Portugueses já esqueceram os Duartes.
Os Portugueses não querem saber dos Duartes.
Os Portugueses acreditam, piamente, no Primeiro-ministro do Burkina Faso e nos líderes do maior partido da oposição que lhes dizem não haver dinheiro suficiente, para satisfazer todas as aflições, porque estamos no meio de uma crise internacional que não controlamos.
Será que os Portugueses algum dia irão acordar para a realidade…
Estamos perante Não Verdades Falsas.
quinta-feira, março 05, 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário